Maio de1948… Foi criado um novo país: Israel, que não seria mais o sonho distante, inalcansável. É como se os profetas houvessem levantado de suas tumbas, como se suas palavras ressoassem de uma forma diferente. Surgiu um grande maravilhamento nas almas do mundo.
Aconteceu o milagre: ISRAEL. A grande virtude de um milagre não é que seja um fenômeno inesperado e inacreditável no qual habita a presença do sagrado, e sim que aconteça a seres humanos, que se sentem profundamente reverenciados com tal presença.
Os judeus não entraram sozinhos em Israel, e particularmente na cidade de Jerusalém. Nós, os que pertencemos a esta geração, fomos levados à cidade de Jerusalém por incessantes torrentes de desejos, orações intermináveis, perseverança, sonhos, de dia e de noite, durante anos, décadas, séculos, milênios, com rios de lágrimas, promessas e esperas, de todas as partes do mundo, de todos os cantos da terra.
Nossos antepassados só puderam sonhar com isso. Para aqueles entre este povo incansável que estiveram em Auschwitz, Jerusalém sempre foi mais distante do que a lua, até que este mesmo bravo povo tomou seu destino em suas mãos.
Hoje, Israel é a expressão do que a determinação, o sonho e a ação podem alcançar. Sem falsas utopias, sem ingenuidade, mas com todo o empenho de um país e de um povo escrevendo e reescrevendo a história.
E é neste contexto que “Hatikva” – (“A Esperança”) foi designado como hino deste país e do povo judeu. A canção confere expressão adequada à aspiração milenar dos judeus de ser um povo livre em sua terra, Tzion (od ló avdá tikvateinu, ahatikvá shenot alpaim, lihiot AM chofshi be’eretz Tzion Ierushalaim). Com o estabelecimento do estado judeu, a Esperança torna-se o hino nacional. Durante mais de 60 anos deste país e com a existência de Israel ainda frágil e definitivamente não assegurada, Hatikvá estabeleceu-se como declaração relevante às aspirações de um povo. Hoje, embora ainda Sderot sofra ataques constantes e o fantasma de futuras guerras ainda pairem neste novo horizonte, fica evidente que as aspirações dos judeus tornaram-se realidade de uma forma impressionante. Apesar de todas as dificuldades e ameaças, o Estado de Israel é uma das grandes histórias de sucesso do século XX com seu passado, seu presente e seu futuro de modernidade e de uma tecnologia quase incompreensível aos demais.
O Estado de Israel surgiu apesar das objeções mundiais, mas já se passaram mais de seis décadas desde então e, embora ainda existam vários pontos de conflito, a parceria entre judeus e árabes em Israel tornou-se fato, não obstante as dificuldades. É isto que comemoramos em Iom Haaztamaut, apesar de todos os desafios ainda presentes. É esta
possibilidade de convivência e de tolerância, que servem de exemplo para o mundo.
Devemos dar devido crédito ao povo judeu por sua iniciativa de reabilitar a história e por estabelecer lugares de memória. Nem sempre é fácil. De fato, às vezes é extremamente difícil, e os conflitos regionais colocam este país sempre na berlinda, no auto-exame ético.
O Iom Haaztamaut é uma data perfeita e marco plausível para que se dêem passos que levem ao estreitamento da solidariedade entre judeus e árabes e a um governo que avance na direção do entendimento global. E Jerusalém é o universo de toda esta saga humana. As palavras saíram deste espaço sagrado e entraram nas páginas dos livros cânones. Mas Jerusalém ainda tem muito mais a dizer. Jerusalém nunca está no final
do caminho. É a cidade onde nasceu a espera por Deus, onde se materializou a antecipação da paz duradoura.
É esta cidade e este país que celebramos hoje. O país da coragem, o país em que a ética, a moral e os costumes estão sempre no inconsciente coletivo. Em Israel, o povo busca ser sempre melhor do que a mulher de César. Sempre teve a perfeição como parâmetro, a noção de ser parceiro e imagem de Deus e, por isso, exposto a tanta crítica
e autoavaliação.
E, mesmo hoje, com a celebração de um milagre tornado realidade, Israel ainda tem que chorar seus heróis. A história antiga e o presente deste país são recheados de sacrifícios e heroísmo. Nãoéà toa que este país considera mister celebrar Iom Hazicaron no exato dia anterior à comemoração de sua independência. Durante dois minutos, as sirenes deste jovem país ressoam, lembrando dezenas de milhares de jovens heróis e mártires, mortos em combate pela sobrevivência desta nação. É incabível imaginar este país sem a referência de cada jovem que faleceu na busca deste ideal. Por isso, quero que todos busquem em suas almas um sentimento de louvor e agradecimento por todos os jovens
que entregaram suas vidas para tornar a existência e a sobrevivência de Israel uma realidade incontestável. São filhos de mães enlutadas, mas também filhos desta terra, deste país (ben haaretz). E hoje, enterrados, fazem parte desta nação, sobre a qual cresceram e à qual amaram.
É a soma destes sentimentos, destes sonhos e desta realidade que celebramos hoje. É decididamente a história se fazendo acontecer.
A voz de Isaías através da Bíblia nos ensina o futuro de paz:
“Sucederá ao final dos tempos…
Pois de Tsión virá a Tora
E de Jerusalém a palavra do Eterno…
Ele será juiz entre as nações
E julgará entre muitos povos…
Uma nação não erguerá a espada contra a outra
Nem se treinará mais para a guerra.
(Isaías 2:2-4)
Floriano Pesaro, sociólogo, ex-secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento Social da Prefeitura de São Paulo e vereador da cidade de São Paulo.