O SR. FLORIANO PESARO (PSDB) – Sr. Presidente, se eu soubesse que iria usar o Grande Expediente no primeiro momento, teria deixado o comunicado de liderança para depois. Porém, feito comunicado, gostaria de, em breves palavras, nobre Vereador Carlos Apolinario, relatar um fato ocorrido na cidade de São Paulo, que é recorrente, e que preocupa, especialmente a mim, que, quando fui Secretário de Assistência e Desenvolvimento Social em São Paulo, tinha um trabalho voltado para crianças e adolescentes abandonados e e respectivas famílias em situação de vulnerabilidade.
Foi com muita tristeza que testemunhamos, na madrugada do último domingo, na Rua Asdrúbal do Nascimento, muito próximo da Câmara Municipal de São Paulo e da 23 de Maio, na região do Centro, uma das maiores mazelas da nossa sociedade: o abandono de crianças.
Em um ambiente fétido, minúsculo e sem condições mínimas de higiene, a Polícia, após uma denúncia, encontrou um grupo de nove crianças, a maioria recém-nascidas, abandonadas em condições precárias por suas próprias mães. Duas delas crianças são gêmeas com pouco mais de sete meses de vida, e as demais possuem de três a seis anos.
Trata-se de uma verdadeira calamidade, uma verdadeira tragédia. E digo isso porque conheço essa realidade na cidade de São Paulo.
Sob a nossa gestão na Secretaria de Assistência Social, entre 2005 e 2008, nós inauguramos mais de 20 abrigos, cada qual com 20 vagas para acolher crianças abandonadas por suas famílias. Devo ressaltar, porém, que esta sempre foi a nossa última opção.
O abrigamento de crianças e adolescentes deve ser a última opção. Nós devemos fazer o possível, trabalhando em conjunto com parceiros, com organizações não governamentais que trabalham com criança e adolescente, para que essas crianças possam ser acolhidas pela própria família. E a única forma de fazer esse tipo de atividade é buscando no seio da família, no núcleo familiar, quais são as demandas que essas famílias têm e que não foram atendidas pelo Poder Público – refiro-me a creches, escolas, pós-escola, atendimento de qualificação e capacitação profissional para os pais, e moradia, numa cidade onde há mais de um milhão e meio de moradias precárias, com pessoas vivendo em submoradias, em áreas de risco, em beira de córrego. Sr. Presidente, quando digo que é uma calamidade é porque conheço essa realidade.
O caso da Rua Asdrúbal do Nascimento, ocorrido no domingo à noite, é um entre centenas, e aconteceu no Centro de São Paulo.
É por isso que tomamos conhecimento e foi por isso que a Polícia foi avisada e chegou com tanta presteza. Estávamos no Centro. Se fosse longe do Centro, nas regiões mais periféricas, muito provavelmente a Polícia não chegaria ou demoraria para chegar.
Digo mais: o acolhimento dado e a velocidade com que se tratou o caso, mais uma vez, é porque estava no Centro. Chegaram a Imprensa e os vizinhos e, dessa forma, conseguimos ter a clareza dessa realidade.
Quero ressaltar, entretanto, que isso acontece todos os dias na Cidade de São Paulo. O abandono, a violência doméstica contra crianças e adolescentes, o alcoolismo e as drogas estão destruindo esse tecido social e as relações intrafamiliares.
Sr. Presidente, o caso chegou a emocionar vizinhos e policiais que participaram da ação de flagrante. As crianças estavam famintas, reviram o lixo da casa em busca de comida e tudo isso no Centro de São Paulo. Estavam passando fome 9 crianças. Elas só foram encontradas porque a maior delas, aos prantos, pedia socorro por minúscula janela que dava para a rua e foi ouvida por um vizinho.
As mães estavam em um bar, mas não quero difamá-las por difamá-las, pois elas não merecem. São tão vítimas quanto suas próprias crianças. Uma delas estava no bar trabalhando, fazendo ‘bico’. E esse ‘bico’ era a necessidade de receber o mínimo de dinheiro para poder dar comida para seus filhos. A outra, a estava acompanhando, pois era parente dela. Era cunhada ou concunhada.
Pergunto, Sr. Presidente: numa cidade onde existem programas como o Bolsa Família, Renda Cidadã do Governo do Estado, Renda Mínima – aprovado por esta Casa -, e programas que vinculam à educação; numa cidade onde existe o Centro de Referência da Assistência Social; mais de duzentos abrigos; uma política de assistência social que envolve mais de oitocentos servidores na Secretaria de Assistência Social, porque deixamos chegar a este ponto?
Não tenho resposta para dar. Tenho consciência do problema e não vou ser leviano. Já fui Secretário. Sei da dificuldade em tratar, nobre Vereador Paulo Frange, conhecedor da realidade das organizações sociais. Mas é preciso agir.
Quando verificamos desta gravidade no Centro de São Paulo, o que avaliamos? A inépcia do Poder Público.
Pode-se traduzir essa inépcia – se não o nobre Vereador Celso Jatene depois chama minha atenção, lembrando que eu pareço o Almino Affonso – pela incompetência do Governo. Afinal, tem de cuidar disso. Não é possível que a situação chegue a este grau de abandono e calamidade no Centro de São Paulo.
Concedo aparte ao nobre Vereador Celso Jatene.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – Obrigado, nobre Vereador. Não quero atrapalhar o raciocínio de V.Exa., mas, primeiro, vamos reconhecer que ao dizer ser V.Exa., algumas vezes, parecido com o Almino Affonso, saiba: é um elogio. Foi um dos maiores tribunos que tivemos no Brasil.
Em seguida, só para fazer justiça com a Polícia Militar de São Paulo – não faço parte da Polícia Militar, mas precisamos fazer justiça – V.Exa. disse, quando eu estava adentrando o plenário, que a Polícia chegou prontamente porque o evento era no Centro.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – A Polícia recebeu a denúncia de um cidadão e apareceu prontamente, como apareceria em qualquer bairro dessa cidade.
– Manifestação na galeria.
– O Sr. Presidente faz soar a campainha.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – O trabalho da polícia é regionalizado; dessa forma, ela não apareceu antes porque a ocorrência era no centro. Se isso acontecesse em qualquer bairro mais distante da nossa cidade, com certeza, se acionada, a polícia apareceria da mesma forma.
Tenho uma pergunta a fazer, até para que eu possa debater o assunto com V.Exa., que já foi Secretário de Assistência Social e trabalhou muito nessa área, assim como também trabalha muito a atual Secretária Alda Marco Antonio, dona de uma gigantesca folha de serviços prestados à Cidade na área social, principalmente em relação à criança.
– Manifestações na galeria.
– O Sr. Presidente faz soar a campainha.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – Se vocês continuarem me atrapalhando, vou mudar meu voto. Por enquanto, meu voto é a favor de vocês.
– Manifestações na galeria.
– O Sr. Presidente faz soar a campainha.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – Quero fazer uma pergunta a V.Exa., nobre Vereador Floriano Pesaro. Aquela moça que estava trabalhando tem dez filhos. Dez filhos! O mais velho com 20 anos e dois menores, gêmeos, com alguns meses.
– Manifestações na galeria.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – Por favor, Sr. Presidente, peço que seja assegurada a minha palavra.
O SR. PRESIDENTE (Claudinho de Souza – PSDB) – Senhores da galeria, peço que respeitem o orador. Ao final, se houver alguma manifestação, com certeza os Srs. Vereadores os respeitarão.
O Sr. Celso Jatene (PTB) – Sr. Presidente, não consigo entender a atitude de alguns cidadãos que vêm a esta Casa para protestar, mas, aí, protestam contra qualquer coisa. Quando chegou às minhas mãos o questionário de vocês para saber se eu iria a votar a favor ou não, imediatamente respondi que voto a favor da CPI. Agora, vocês ficam me atrapalhando. Quero falar, quero fazer um debate, mas vocês não deixam. Não entendo isso. Não podemos dar nossa opinião?
O que quero saber de V.Exa., Vereador Floriano, é o seguinte: uma das moças, a que estava fazendo “bico” no bar – trabalhando, como disse V.Exa. -, tem dez filhos. O mais velho, com pouco mais de 20 anos; os mais novos, gêmeos, com meses. Qual é o trabalho que o Poder Público tem feito em relação a essas mães que chegam a ter dez filhos, de vários pais e até de várias gerações diferentes.
O SR. FLORIANO PESARO (PSDB) – Nobre Vereador Celso Jatene, um dos mais brilhantes desta Casa,…
– Manifestações fora do microfone.
O SR. FLORIANO PESARO (PSDB) – Sr. Presidente, peço que me seja garantida a palavra, pois, realmente, estamos sendo atrapalhados neste debate, e julgo que essa não é a forma correta de os cidadãos que ocupam a galeria participarem das sessões, interrompendo o debate parlamentar. Peço respeito e que me seja garantido o tempo de fala.
– Manifestações fora do microfone.
O SR. PRESIDENTE (Claudinho de Souza – PSDB) – Suspenso o tempo do nobre Vereador Floriano Pesaro para dar o seguinte aviso ao pessoal da galeria. Temos tempo regimental para as falas dos Srs. Vereadores. Quando o Vereador se inscreve para falar, escolhe um tema e se prepara para isso. A partir do momento em que os senhores o interrompem, sou obrigado, a pedido do Vereador, a restituir-lhe o tempo; do contrário, não haveria tempo para o Vereador se manifestar e até para colocar em votação a matéria que é de interesse dos senhores que vieram a esta Casa. Assim, peço que garantam a palavra dos Srs. Vereadores, respeitando-os como nós respeitamos os senhores e o motivo que os trazem aqui.
Peço que o tempo do nobre Vereador Floriano Pesaro seja restituído.
O SR. FLORIANO PESARO (PSDB) – Muito obrigado, Sr. Presidente.
Pode até parecer que o nobre Vereador Celso Jatene combinou comigo a resposta que darei à questão que ele formulou, mas ela já está aqui, Vereador, devidamente delineada, desde quando escrevi meu discurso. Respondo-lhe o seguinte: precisamos ter maior responsabilidade no que diz respeito ao planejamento familiar no Brasil, que é ainda um tabu, dentre os muitos que ainda temos de discutir na nossa sociedade – seja por questões religiosas, seja por questões de opinião. É importante destacarmos que hoje, na rede pública de saúde, o SUS já garante o planejamento familiar, mas ele não ocorre. O SUS já garante a distribuição de pílulas anticoncepcionais, mas é difícil encontrá-las. O SUS garante a distribuição de pílulas do dia seguinte, mas é difícil encontrá-las. Também garante a distribuição de preservativos, mas é difícil encontrá-los. E assim por diante. Chama-nos a atenção essa inépcia do Poder Público; e, fazendo essa observação, não estou criticando o Secretário “a”, “b” ou “c”, até porque se trata de uma máquina, de uma política pública que não funciona. Porque, se funcionasse, Vereador Celso Jatene, num país como o Brasil e numa cidade como São Paulo, com tantos recursos e com tantos programas para atendimento, não haveria uma barbaridade dessas. Trata-se de uma barbárie isso que presenciamos a menos de um quilômetro desta Casa. Quando eu quis dizer Centro e Periferia, é que estão a um quilometro desta Casa. É a região mais rica da Cidade de São Paulo. Onde tem maior infraestrutura urbana de equipamentos e serviços públicos. Agora, não há de fato uma preocupação, uma priorização no tratamento desse tema. Essa moça, que tem por volta de 37 anos, têm 10 filhos. Como 10 filhos? Como chegou em 10 filhos?
Outro dia, andando pela região de Capão, uma moça veio conversar comigo e disse: olha, já fiz planejamento familiar, quero fazer a laqueadura e não consigo. O companheiro queria fazer vasectomia, não conseguia. Seis meses de espera para analisar, porque depois é difícil a reversão. O SUS paga mas tem de ter um tempo de reflexão, análise. Vontade pessoal. No protocolo do SUS o rapaz não tinha idade suficiente. Tem de ter uma idade mínima para essa opção, mas a mulher já tinha. E nenhum dos dois não conseguia no serviço público. Aliás a laqueadura estava previsto para sete meses depois. Ela já tem seis filhos com 34 anos.
Não é possível que o Poder Público ao atender na UBS, no SUS, não possa observar e dar orientação. Não é decisão . Aqui não é a China que decide que cada família vai ter um filho. O planejamento familiar é obrigação do estado brasileiro. Aliás está previsto na Constituição e nos protocolos do SUS.
Porque destaco essa questão? Primeiro porque acredito que não seja um fator, sim um conjunto de fatores. Depois, que o Estado não vai chegar para atender na saúde ou na assistência, educação. Mas é um conjunto de atendimento. É multidisciplinar. É transversal. Tem de identificar na família que precisa ser atendida de forma integral. Identificar o núcleo familiar, saber quais são os problemas e as propostas de políticas publicas, as ações públicas que possam ser efetivamente aplicadas àquela família.
Lembrando, cada família tem uma questão, um problema, uma demanda. Não dá para tratar de forma planificada. É preciso ter um olhar particular para cada uma dessas famílias e desses problemas. É por essa razão que temos de ter o serviço social, a saúde e assistência junto com psicólogos, psiquiatras, assistências sociais e educadores trabalhando nessa direção.
Muito obrigado.