Ele se chamava José Vicente de Faria Lima. Na Aeronáutica era o Brigadeiro Faria Lima, depois eleito tornou-se o Prefeito Faria Lima. Na realidade ele era o jardineiro de uma rosa, uma rosa chamada São Paulo, regada com o suor do povo trabalhador desta terra.
Faria Lima é quem melhor representa o espírito e o dinamismo desta cidade mundial cuja vocação é liderar e apontar o futuro para os brasileiros. Neste ano estamos comemorando o centenário de nascimento do eterno Prefeito de São Paulo.
Chegava ao mundo em 7 de outubro de 1909 no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, aquele que seria o mais paulista de todos os cariocas. Faria Lima era o mais velho de cinco irmãos. Filho de João Soares Lima, imigrante português casado com uma capixaba de personalidade forte, D. Castorina Faria Lima. Todos ingressaram na carreira militar e atingiram o generalato em suas respectivas forças, a Aeronáutica e a Marinha de Guerra. Todo era tríplice coroado, que em linguagem militar significa dizer que todos eram primeiro alunos de suas turmas. O Almirante Floriano Faria Lima, que foi o Governador da fusão dos Estados da Guanabara e Rio de Janeiro, ainda vive com seus 91 anos.
Faria Lima teve uma brilhante biografia militar, tendo participado com o Brigadeiro Eduardo Gomes da criação da Aeronáutica sendo um dos pioneiros do famoso CAN, Correio Aéreo Nacional, fator decisivo da integração nacional. Formou-se Engenheiro Aeronáutico em Paris.
Nas idas e vindas da carreira, ainda como Coronel, acabou transferido para São Paulo para o Parque da Aeronáutica no Campo de Marte. Destacou-se como administrador e ficou conhecido pelo apoio que a unidade militar que comandava oferecia a nascente indústria automobilista. Acabou atraído para a política pelo Presidente Jânio Quadros, inicialmente para presidir a VASP e posteriormente tendo sido Secretário de Viação Transporte e Obras Públicas na gestão de Jânio como Governador de São Paulo. Desenvolveu uma obra gigantesca com destaque para a construção e asfaltamento de estradas no interior Estado de São Paulo. Permaneceu Secretário na administração Carvalho Pinto e com a vitória de Jânio Quadros para a Presidência seguiu para Brasília onde ocupou a presidência do BNDE.
Em 1962, foi candidato a vice-governador na chapa com Jânio Quadros para Governador. Perdeu a eleição. Disputou a Prefeitura em 1965 e obteve uma esmagadora vitoria nas urnas. Ganhou uma decisiva batalha por mais verbas para as capitais e com isto assegurou os recursos para seu plano de obras. Sua administração foi a mais fecunda da história da cidade. Revolucionou a fisionomia da metrópole preparando São Paulo para seu destino Sua visão de futuro guiava suas ações. Rasgou inúmeras avenidas, como a 23 de Maio, Av. Ruben Berta, a Radial Leste, a Estrada de Itapecerica. Inclusive, as Marginais. Alargou e duplicou entre outras a Av. Rebouças, a Rua da Consolação, a Av. Sumaré, a Av Pacaembu, Av Cruzeiro do Sul, antiga Rua Iguatemi, Av Rio Branco.
Construiu escolas, privilegiando o ensino profissionalizante, edificou o Hospital da Lapa e inúmeras unidades de saúde e conjuntos habitacionais. O Parque Continental, a COHAB e a primeira creche são obras suas. Desenvolveu os estudos e pilotando uma moto-niveladora iniciou as obras do Metrô de São Paulo. Acompanhava pessoalmente os canteiros de obras implantados na cidade. Madrugava, dirigindo seu Fusquinha vermelho inspecionando sozinho, o andamento das obras. Era um homem enérgico. Não era de discursos, mas de ação. “Fazejamento” era sua palavra chave.
O ritmo de obras durante sua gestão era alucinante. Na sua mesa de trabalho no Ibirapuera, antiga sede da Prefeitura, destacava-se uma plaqueta de madeira que dizia: “o homem que se decide a parar até que as coisas melhorem, verificará mais tarde que aquele que não parou está tão adiante que jamais será alcançado”. Deu nova feição à estrutura administrativa da cidade criando as Administrações Regionais, construiu a nova Câmara Municipal, o MASP, inaugurado com a presença da Rainha da Inglaterra, criou o Tribunal de Contas do Município, promoveu uma ampla reforma do funcionalismo municipal. Foi sua a iniciativa de elaborar o primeiro Plano Diretor do Município de São Paulo.
Mais do que as obras materiais que moldaram a moderna São Paulo são os valores intangíveis de sua personalidade, como seu exemplo de dedicação ao trabalho, seu amor à cidade, sua persistência, sua dedicação que iluminam a lembrança do Brigadeiro Faria Lima. Neste momento conturbado que atravessamos, onde os verdadeiros valores parecem ter sido eclipsados, o exemplo de Faria Lima, suas virtudes como homem, como brasileiro devem ser reverenciadas para servir de norte as novas gerações.
Podemos avaliar a dimensão de Faria Lima ao percebermos que o Brigadeiro mostrou ser possível domar, gerenciar o desenvolvimento da mega cidade. Evitar a “deseconomia”, característica de cidades gigantes. Surgiu no momento crucial, em meados da década de sessenta quando explodia o crescimento demográfico da capital. Não admitiu ficar um dia sequer além do mandato conquistado nas urnas. Deixou a Prefeitura que a partir de então teve seus prefeitos indicados pelo governador. Pesquisas da época apontavam índices inacreditáveis, jamais igualados, que atingiam 97% de aprovação popular Sua escalada política era previsível. Ao deixar a Prefeitura vivia a frustração de não poder ofertar sua energia e capacidade de realização em favor da população que tanto amava. Faria Lima morreu no auge de sua popularidade. Teve sua vida ceifada aos 59 anos de idade.
A notícia de sua morte comoveu a população de São Paulo. Uma multidão silenciosa começou a se reunir em frente a sua casa, na rua São Benedito em Santo Amaro. Todos portando uma rosa nas mãos. Os brasileiros de São Paulo o acompanharam perplexo até a sua última morada no cemitério do Campo Grande Nascia um mito. Faria Lima ficou no imaginário paulistano como o realizador, como aquele que construiu os alicerces de São Paulo e humanizou São Paulo.
O tempo passa rápido demais. A vida é um lampejo de luz entre duas noites muito longas e escuras. Pouca gente sabe que o Brigadeiro José Vicente de Faria Lima esteve muito próximo a assumir a Presidência da República no dia quatro de setembro de 1969. Estava no Rio de Janeiro evitando uma crise militar que poderia ter tido conseqüências desastrosas. Ele seria o substituo do Presidente Costa e Silva. Os insondáveis desígnios de Deus e a cruel ironia do destino não permitiram Um enfarto fulminante, na casa de Aurora Miranda, grande amiga da família, frustrou o Brasil.
O “One-eleven” presidencial fez escala em São Paulo deixando o seu irmão o Ten Brigadeiro Roberto Faria Lima, então comandante da V zona Aérea em Porto Alegre para as cerimônias fúnebres e seguiu viagem para Brasília para dar posse ao General Médici. Comandante do III Exército. A história oculta da nação nos deixa a imaginar como poderia ter sido a realidade do Brasil caso Faria Lima tivesse assumido a cabine de comando. Vôos altos, em céus de brigadeiro, quem sabe nos teria levado a sonhar os nossos sonhos de grande nação.
O “fazejador” foi uma alternativa perdida. Por maior que sejam as homenagens a serem prestadas ao Brigadeiro Faria Lima neste ano de seu centenário de nascimento, ainda serão poucas pelo exemplo de vida que nos deixou de herança.
Faria Lima, escreveu a mais bela história de amor por São Paulo e tem seu lugar cativo nas mentes e corações de São Paulo.
J.R. Faria Lima, ex-deputado federal, ex-presidente da Prodam/SP, membro do Conselho de Economia da Fecomércio.
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