Compartilho nessa noite de domingo meu mais recente artigo publicado na Revista do Clube Hebraica SP sobre o impacto social e as alternativas que temos frente às consequências da pandemia. Leia e compartilhe.
“A lógica do bem-estar social israelense”
Há um assunto que entrou, mais do que nunca, em evidência durante a pandemia do novo coronavirus e – certamente – permanecerá durante algum tempo após ela: o impacto social da crise nos mais vulneráveis. Sobre isso, quase todos os países estão tomando medidas de impacto, muitos deles aumentado o gasto público na área social de maneira recorde, haja vista a previsão de aumento inédito da faixa de pobres no mundo todo. Mas, aqui – dado o grau de imprevisibilidade dos impactos da pandemia – quero focar na necessidade perene das pessoas em vulnerabilidade, independentemente da pandemia. E nesse ponto, temos – também – que olhar para a bem sucedida experiência israelense.
O Brasil possui um sistema único que organiza, disciplina e financia os serviços socioassistenciais, programas, projetos e benefícios sociais que são oferecidos de forma universal com critérios específicos. O Sistema Único da Assistência Social (SUAS) representou um avanço secular nas práticas socioassistenciais brasileiras e inaugurou uma nova era de combate à pobreza, contudo há a impressão que esse sistema e seus serviços não produzem um resultado palpável, fora do âmbito imediato da transferência de renda, que tenha um efeito mitigatório na pobreza.
Essa crítica, ecoada por muitos trabalhadores e estudiosos da Assistência Social, ficou ainda mais clara durante a pandemia do novo coronavirus, quando – embora tenham sido classificados, corretamente, como essenciais – os serviços socioassistenciais não foram assim reconhecidos nem por si, nem pelos governos e nem pela população.
A principal razão desse desconhecimento reside na falta de entendimento do seu papel e, também, na falta da efetividade do seu resultado e as razões para isso merecem um extenso estudo e discussão. Contudo, podemos olhar para Israel como uma interessante abordagem sobre o bem-estar social para nos inspirarmos.
Em Israel, a lógica do bem-estar social esteve presente desde a criação de Eretz Israel numa esquemática bastante próxima a nossa e à europeia: universal na abordagem, no planejamento e no atendimento, características que – não por acaso – nos fazem lembrar o Sistema Único de Saúde (SUS) aqui no Brasil. Contudo, verificando a diluição dos resultados de iniciativas universais frente aos gastos altos direcionados para essa rede de proteção social, o governo israelense resolveu reformar seu sistema de bem-estar social sob a lógica da discriminação positiva em três pilares: fluxo, estoque e ‘buffers’. Os três pontos podem ser traduzidos num vocabulário mais próximo da nossa realidade, como: direcionamento ao emprego, aprimoramento de habilidades e integração social, e assistência aos mais vulneráveis.
Os israelenses, então, mudaram a lógica de construção das políticas públicas sociais para um desenho customizado que considere as particularidades dos grupos mais vulneráveis, inclusive características culturais, sociais e, até religiosas, alcançando um alto índice de retorno do investimento. Exemplo disso é o programa “New Way” desenvolvido pelo Ministério de Aliá e Absorção da Imigração – uma pasta bastante particular de um país que é porto seguro para judeus de todo o mundo – em coordenação com outros ministérios que tem como objetivo integrar as comunidades etíopes na sociedade israelense. Não era o objetivo apenas integrá-las, como colocar suas crianças nas escolas israelenses, mas, coloca-las em pé de igualdade de oportunidades com as crianças israelenses.
Esse é um exemplo da lógica que perpetuou todo o programa desenvolvido em 2015.
Considerando todas as diferenças e particularidades que distinguem Israel do Brasil, é fundamental – ainda mais num momento em que constatamos mais claramente algumas falhas importantes no nosso sistema de bem-estar social – olhar para experiências diferentes daquelas que embasaram a construção do SUAS por aqui. Pode, ou não, ser um caminho para aumentarmos o impacto social positivo dos nossos investimentos e garantimos um futuro de equidade, justiça e humanidade.
Floriano Pesaro
Sociólogo”