Aliados não obtêm maioria para garantir tramitação do projeto na Casa.
Do G1 São Paulo
Cerca de 200 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) passaram a madrugada desta quarta-feira (25) acampados na frente da Câmara Municipal de São Paulo, no Centro. A pista da esquerda da Rua Maria Paula, na frente da sede do Legislativo da cidade, segue bloqueada pelos manifestantes nesta tarde, segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).
O protesto do grupo começou na noite de terça (24). O acampamento é o mais recente de uma série de atos realizados pelos sem-teto desde o segundo semestre de 2013. Eles pressionam para que terrenos tomados por ocupações sejam destinados a moradias populares pelos vereadores na revisão do Plano Diretor Estratégico (PDE).
O PDE é a lei que vai orientar o desenvolvimento da cidade nos próximos anos e dá diretrizes para atualização de outras leis importantes, como a de Zoneamento, a de Uso e Ocupação do Solo e o Código de Edificações. O projeto está em tramitação desde setembro de 2013, quando o prefeito Fernando Haddad (PT) enviou sua primeira versão do texto para os vereadores.
Após uma sequência de audiências públicas, análise de comissões e da primeira aprovação em plenário, a votação final sofre impasse na Câmara.
A oposição quer mais tempo de debate e os aliados do prefeito enfrentam dificuldade para obter maioria que garanta o avanço na tramitação do projeto de lei.
Segundo o presidente da Câmara, José Américo (PT), os vereadores trabalham para iniciar a votação nesta sexta (27). O vereador lembra que a Câmara deve entrar em recesso a partir do dia 1º, após a aprovação de outro projeto importante: a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Nesta quarta, Haddad afirmou que os vereadores precisam de “paz”, “respeito” e “tranquilidade” para votar o PDE. “O processo todo foi bem conduzido. As questões partidárias foram colocadas um pouco de lado em proveito da cidade. Agora é o caso de darmos um grande voto de confiança para que a Casa, em tranquilidade, em paz, possa deliberar sobre o tema”, disse o prefeito.
Troca de acusações e críticas
Na terça-feira, os sem-teto usaram faixas, boneco e carro de som para acusar o vereador da oposição José Police Neto (PSD) de ter relação com empresas do ramo imobiliário. Guilherme Boulos, um dos líderes do MTST, disse que Police Neto é um dos maiores interessados no travamento do projeto. “Por que esse cidadão não está querendo que tenha moradia? Fomos descobrir que só de empreendedora ele recebeu R$ 400 mil para financiar a campanha dele”, afirmou Boulos.
na terça-feira (Foto: Lívia Machado/G1)
O vereador rebateu o líder do MTST. “Nós recebemos uma doação lícita e, portanto, ela está à disposição da sociedade. Esses recursos estiveram oferecidos a muitos parlamentares que estão aqui e inclusive ao prefeito Haddad”, afirmou Police Neto.
O presidente da Câmara disse que, diante do ataque do MTST ao vereador Police Neto (PSD), algumas bancadas, em solidariedade, se recusaram a marcar suas presenças.
A base de apoio de Haddad conta com os votos do PSD de Police Neto para aprovar o Plano Diretor. Nesta quarta-feira, o partido deve indicar apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff em Brasilia, o que mostra a proximidade entre a legenda e o PT.
Police e líderes dos sem-teto chegaram a se reunir à noite para aparar arestas. O vereador disse ao G1, após o término da reunião, que não recebeu pedido de desculpas do MTST e nem esperava por isso.
Ele disse que saiu do encontro com mais dúvida do que qualquer outra coisa. Para o vereador, a cada minuto fica mais difícil a solução. Questionado se agora o PSD deve votar o projeto, respondeu: “A gente quer um plano bom para a cidade e esse ainda não é um plano bom.”
Vereadores constrangidos
A presença do MTST em frente aos portões e dentro do plenário da Câmara provocou constrangimentos na noite de terça. O líder do PSDB, Floriano Pesaro, levantou a suspeita de que o relator do Plano Diretor, Nabil Bonduki (PT), tem relação com os sem-teto.
Bonduki, relator do Plano Diretor, afirmou que “é infundada” a afirmação e também criticou a ação dos sem-teto. “É claro que todo cidadão tem direito de se manifestar, mas isso não pode ser feito de maneira que constranja os vereadores”, disse o relator. Andrea Matarazzo (PSDB) afirmou que o MTST sitia a Câmara e impede a entrada e saída dos vereadores.
Sem maioria
Apesar da reunião que o prefeito Fernando Haddad fez com líderes da base aliada na terça, a votação do projeto anda devagar devido à obstrução imposta pela oposição, liderada pelo PSDB, e à falta de entusiasmo dos aliados do prefeito na Câmara. O prefeito Fernando Haddad previa a votação do Plano Diretor nesta semana.
No entanto, a base aliada não conseguiu avançar em etapas triviais da rotina da Câmara. Não houve, por exemplo, os 28 votos necessários para dar como lidos os papéis recebidos pela Mesa Diretora, procedimento que aceleraria a tramitação do Plano Diretor. Na semana passada a base governista já tinha sido derrotada na tentativa de aprovar o feriado em dia de jogo do Brasil em São Paulo.
vereador que preside a
Comissão de Política Urbana
Oposição critica pressão
Até mesmo o presidente da Comissão de Política Urbana, Andrea Matarazzo (PSDB), que embora seja da oposição vinha adotando discurso no sentido de despolitizar a votação do projeto, agora adota postura diferente e promete obstruir a votação do projeto.
Para Matarazzo, o projeto precisa ser votado com tranquilidade e não sob pressão. Ele defende que a votação seja adiada para o segundo semestre. “O projeto não está pronto para ser votado. E principalmente não se pode votar nesse nível de pressão que estão fazendo hoje em dia”, afirmou Matarazzo.
O PSDB se opõe, por exemplo, ao tempo de validade do Plano Diretor. O PT quer 16 anos e os tucanos acham que 10 anos é o ideal. Matarazzo também considera que regularizar áreas invadidas é tema fora de questão. “Não vamos usar o Plano Diretor para regularizar ilegalidades”, afirmou.
O vereador também se opõe à proposta de adoção de gabaritos de oito andares para edifícios nos miolos dos bairros e é contra a flexibilização de usos nas zonas estritamente residenciais.
Já Milton Leite (DEM) apontou dúvidas técnicas como Zeis em área de ecopontos e mananciais. “São coisas simples que precisam ser resolvidas.”
Ricardo Young (PPS) defendeu o uso do período de recesso para a segunda apreciação das emendas para garantir transparência ao processo de votação. Segundo ele, por mais que a Prefeitura e o MTST pressionem pela aprovação imediata do plano, é preciso haver clareza sobre quais das 330 emendas propostas pelos vereadores foram consolidadas no último substitutivo publicado e como elas fazem avançar na direção do melhor Plano Diretor.